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Belo Horizonte e Ouro Preto, Minas Gerais, Brazil
Doutora e Mestra em Direito Privado pela PUC Minas. Especialista em Direito Processual e Direito Civil. http://lattes.cnpq.br/0058010358863049 Pesquisadora do Centro de Estudos em Biodireito - CEBID: www.cebid.com.br Professora Assistente II do Departamento de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP: http://www.direito.ufop.br/ Advogada do NAJOP/UFOP Vice Coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa da UFOP - CEP/UFOP Blog: http://iaraufop.blogspot.com/ http://www.arraeseditores.com.br/aconselhamento-genetico-e-responsabilidade-civil.html

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quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Criança terá duas mães e um pai em seu registro

Criança terá duas mães e um pai em seu registro


Decisão | 17.09.2014
Uma criança da comarca de Nova Lima terá em seu registro o nome de duas mães e de um pai. Constará no documento o nome da mãe biológica e dos pais adotivos. A decisão foi possível a partir da aplicação da moderna doutrina da mutiparentalidade, que consiste basicamente na possibilidade de uma pessoa possuir mais de um pai e/ou mais de uma mãe, simultaneamente, e produz efeitos jurídicos em relação a todos eles. Assim, os nomes dos pais biológicos são mantidos, mas acrescenta-se no registro de nascimento o pai ou a mãe socioafetivos.

O pedido de adoção foi feito por um casal de Nova Lima, pois a criança vive com ele desde o nascimento, pelo fato de a mãe ter morrido em abril de 2011, em virtude de complicações pós-parto. O pai biológico da criança é desconhecido. Os pais adotantes, o irmão da mãe biológica e sua esposa, alegaram ter condições de oferecer ao menor boas condições para o seu sustento e educação, bem como para o seu desenvolvimento físico, mental e social.

A Defensoria Pública foi nomeada curadora do menor e não concordou com a adoção por entender que a criança não foi abandonada por sua mãe e, portanto, não era razoável a perda dos vínculos com a mãe biológica. Assim, para a Defensoria Pública, o casal deveria ter apenas a guarda definitiva da criança.

O Ministério Público manifestou-se favorável aos pedidos do casal, ressalvando a manutenção do nome da mãe biológica no registro, prevalecendo-se os princípios que regem o direito em detrimento à legislação engessada.

Proteção integral

Para o juiz Juarez Morais de Azevedo, titular da Vara Criminal e da Infância e da Juventude de Nova Lima, no caso em questão, não há que se cogitar na destituição do poder familiar, como normalmente ocorre nos casos de adoção, pois a mãe não abandonou o menor. “Qualquer decisão deve orientar-se pelo melhor interesse e proteção integral, o que, no presente caso, impõe a adoção pelos requerentes, que têm todas as provas constantes nos autos favoráveis”, disse o magistrado.

O juiz citou ainda o parecer constante no estudo social, que deixou claro que a adoção irá regulamentar uma situação que ocorre de fato desde o nascimento da criança, além de tratar do seu melhor interesse.

O magistrado levou em conta também a oposição da Defensoria Pública em relação ao pedido de adoção. O defensor salientou que uma das consequências da adoção é o rompimento do vínculo com os pais biológicos, “medida extremamente gravosa”, uma vez que a mãe não abandonou o menor.

Para Juarez Morais de Azevedo, a sugestão do Ministério Público de que a adoção seja deferida, sem, contudo, a perda do vínculo com a mãe biológica, traz à baila debate interessante em relação aos novos arranjos familiares da atualidade, que têm refletido no direito de família. “Com amparo constitucional, o conceito de família tem se alargado para abranger as mais diversas formas de núcleos familiares, dando especial relevo ao afeto entre os conviventes e às situações de fato, ainda não amparadas expressamente pelo ordenamento jurídico”, destacou o magistrado.

Multiparentalidade

O juiz afirmou que a multiparentalidade privilegia o melhor interesse da criança, que tem direito ao conhecimento de suas raízes biológicas, mas também de reconhecer como seus pais aqueles que a criam, dedicando-lhe amor e cuidados.

“Desta feita, o menor será o mais privilegiado com a situação, eis que, além de possuir em seu registro todas aquelas pessoas que contribuíram na sua formação e história de vida, fará jus a alimentos, benefícios previdenciários e sucessórios de todos eles”, disse o magistrado. Para ele, “a manutenção do nome da mãe no registro protege não só a memória da falecida, que trouxe em seu ventre o menor e certamente o amou, mas também o melhor interesse da criança, que terá conhecimento de seu passado, não passando pelos traumas advindos pela suposição de que foi rejeitado pela mãe”, pontuou.

Com essa fundamentação, o juiz entendeu ser possível o deferimento da adoção sem o rompimento dos vínculos biológicos.

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9 comentários:

  1. Isadora Fernandes Marioza20 de outubro de 2014 às 23:37

    A função da família atua é propiciar o livre desenvolvimento da personalidade de seus membros, formados por meio do afeto, da publicidade e da estabilidade. Assim vejo a decisão do juiz totalmente coerente, não só com o atual conceito de família, mas também com uma interpretação jurídica constitucional das normas vigentes de direito das famílias. Isso porque a coexistência de relações familiares permite ao filho manter suas raízes biológicas, e ainda, garantir uma relação eudemonista, resguardando todos os direitos da criança. Evidentemente a ideia é de acréscimo e não traz, em hipótese alguma, prejuízo a criança.

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  2. Taís Laiara Costa Rodrigues21 de outubro de 2014 às 14:13

    A multiparentalidade proporciona o reconhecimento de vínculos familiares entre pessoas que antes não seriam considerados como seus pais, significa portanto a legitimação da paternidade/maternidade daquele que cuida do menor como se filho seu fosse. Assim, é possível que uma criança tenha mais de um pai ou mais de uma mãe. O Brasil adotou o princípio do melhor interesse da criança como norma na CR/88, no ECA e implicitamente no Código Civil, sendo assim, a decisão pela concessão da multiparentalidade deve basear-se no melhor interesse da criança, que simboliza a garantia dos direitos dos menores. Ao se proporcionar tal reconhecimento, reconhecemos novos modelos de família, desde que fundados nos elementos de afetividade, publicidade e estabilidade, sendo um espaço para o livre desenvolvimento da personalidade de cada um de seus membros.

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  3. Yollanda Farnezes Soares22 de outubro de 2014 às 13:44

    A família contemporânea compreende uma pluralidade de formações, cumprindo uma função social voltada à tutela existencial de seus membros, amparada e fundada numa relação afetiva entre eles. Dessa forma, considero e analiso a decisão judicial correta e lógica, pois, ao se deferir a adoção da criança sem a perda do vínculo biológico com a mãe, o juiz considerou as mais diversas facetas da concepção de família, dando proteção à ela, conforme assegurado na Constituição da República, artigo 226, e assim, por conseguinte, tutelando e amparado o desenvolvimento no seio familiar, em especial, na pessoa da criança.

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  4. Levando em conta o princípio da família eudemonista, que busca a realização plena de seus membros, é necessário o Estado relativizar o que está na lei de tal modo que as famílias possam alcançar sua realização da maneira que bem entenderem. Como o Juiz do caso afirmou, é necessário buscar sempre o melhor interesse da criança, pensando a longo prazo. Assim, como o ordenamento jurídico não prevê a multiparentalidade, esta tem que ser construída ao longo de decisões judiciais como essa do caso em tela.

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  5. Resta claro aqui a consideração dos princípios jurídicos que regem nosso ordenamento, bem como o entendimento jurisprudencial de nossos Tribunais em face do Direito positivado. Fora brilhante a proposta do representante do Ministério Público, dando parecer favorável a multiparentalidade, sendo a mesma reafirmada pelo magistrado em sentença, haja vista que foi unânime a intenção de ambos em valorizar o interesse maior da criança. Não desconsiderar a mãe biológica em sede de registro civil para que a mesma ocupasse sua condição de mãe junto aos pais adotivos, é permitir a criança o direito à memória de sua mãe com a devida valorização em comum dos pais adotivos. É evidenciada com a decisão do magistrado a utilização de fundamentos de amparo constitucional, permitindo a inserção dessa criança em um ambiente propício ao livre desenvolvimento de sua personalidade, sem desconsiderar, todavia, o afeto de sua mãe ao longo de sua gestação.

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  6. Paula Valério Henriques4 de novembro de 2014 às 11:25

    A partir da constitucionalização do direito civil, abarcando o direito das famílias, percebemos que o conceito de família vem se dilatando para abranger as mais diversas formas de meios familiares existentes atualmente. Neste padrão encontra-se o reconhecimento da multiparentalidade, que representa um avanço de maneira geral. Com tal reconhecimento se encontra resguardado o princípio da dignidade humana. Assim, entendo que a decisão do juiz da comarca de Nova Lima foi correta, visto que garante à criança o livre desenvolvimento de sua personalidade e, além de manter seu laço biológico com a mãe falecida, ainda preservará o vínculo afetivo com os pais adotivos.

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  7. A leitura constitucional dos dispositivos trazidos pelo Direito das Famílias nos leva a concluir que o reconhecimento à multiparentalidade é passo importante para a eficácia da melhor proteção do menor, bem como atende aos anseios eudemonistas da família.
    A decisão do juízo foi acertada, pois reconheceu que os laços biológicos com a falecida mãe e os vínculos afetivos com os pais adotivos podem coexistir. Não é necessário que um desapareça para que o outro se configure.
    Ademais, o reconhecimento à multiparentalidade garante direitos sucessórios, previdenciários e aos alimentos, portanto, protege os interesses do menor.

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  8. Marina Cotta Gonçalves13 de novembro de 2014 às 17:55

    A Constituição da República de 1988 trouxe para o centro do ordenamento jurídico a dignidade da pessoa humana, que passa a valorizar o ser ao invés do ter. Hoje, o Código Civil de 2002 deve ser interpretado através de uma visão civil-constitucional, que passa a ser preocupar com o ser humano em si mesmo, na busca de sua felicidade. A multiparentalidade, reconhecida hoje como espécie de família, faz parte parte desse novo conceito de família, que busca o ambiente propício ao livre desenvolvimento da personalidade de seus membros. Dessa forma, a situação descrita acima é um retrato do Estado Democrático de Direito, que respeita o projeto de vida das pessoas.

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  9. É inegável a responsabilidade dos juristas no que tange ao reconhecimento e a proteção de direitos dos que necessitam, hoje o princípio da pluralidade das entidades familiares abrangeu e resguardou as garantias dos núcleos familiares que antes não eram reconhecidos, por serem diferentes do estipulado na norma e do esperado pela sociedade. Esse caso é um exemplo da constitucionalização do direito e da preservação dos princípios, como um instrumento mais próximo da realidade da população, por ser mais abrangente, menos formal e consequentemente mais mutável, de forma que acompanha as mudanças sociais e as transporta para o universo jurídico. A multiparentalidade, quando benéfica para o bom desenvolvimento da criança e dos outros membros da família, deve ser reconhecida como fora feito pelo Elmo .Juiz da Vara Criminal e da Infância e da Juventude de Nova Lima.

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